terça-feira, 31 de maio de 2011

Mulher proibiu durante cinco anos as irmãs de se aproximarem da sepultura da mãe

A mãe das mulheres envolvidas neste processo faleceu em 2004 e foi enterrada numa sepultura que, dois anos depois, viria a ser comprada por uma das filhas.

Esta, a partir daí, e invocando o direito de propriedade, impediu as irmãs não só de colocarem flores e outros objectos no túmulo da mãe, mas também de se aproximarem do respectivo talhão e de aí rezarem.

O caso foi parar a tribunal, tendo a primeira instância validado a proibição imposta pela proprietária, mas as irmãs recorreram para o Tribunal da Relação de Coimbra, que, por acórdão de 17 de Maio, a que a agência Lusa hoje teve acesso, invocou o “direito de personalidade” para condenar a dona do talhão a permitir a terceiros o culto da pessoa ali sepultada.

No acórdão, os juízes sublinham que os cemitérios municipais e paroquiais são bens do domínio público, porquanto são objecto de propriedade de uma autarquia local, são destinados à inumação dos cadáveres de todos os indivíduos que falecerem na circunscrição e o acesso a eles é livre.

Frisam ainda que há mais de 6.000 anos, na cultura megalítica, já se praticava o culto funerário, “o que é bem revelador da necessidade, quase instintiva, que logo as primeiras sociedades sentiram de estabelecer uma relação com os que vão morrendo, necessidade essa que se manteve, ininterruptamente, até aos nossos dias”.

“Os direitos de personalidade, na sua vertente moral, englobam o direito a manter uma relação espiritual com os familiares falecidos, nomeadamente com os que são próximos, como é o caso dos pais. Essa relação espiritual pode concretizar-se de diversas formas, algumas das quais passam pela proximidade física da sepultura onde o falecido se encontra sepultado, para junto a essa campa, em recolhimento, rezando ou não rezando, se estar com aquele que já não se pode abraçar”, refere ainda o acórdão.

Defende que quando houver colisão de um direito de personalidade com um direito de propriedade, o primeiro “prevalece” sobre o segundo, embora de forma não absoluta.

Por tudo isto, a Relação considera que “não se vê com que fundamento” é possível impedir a qualquer pessoa de se aproximar de um talhão onde está uma sepultura e de aí rezar.

O tribunal condenou a proprietária a autorizar as irmãs a aproximarem-se da sepultura da mãe e rezarem junto ao local e ainda a colocarem, “de tempos a tempos, designadamente em dias com carga simbólica”, um ramo de flores na campa.

No entanto, e em nome do direito de propriedade, as irmãs não podem colocar lápides ou vasos de flores na sepultura, já que estes são “actos sobre a coisa concessionada”.

in Público

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